«Os Romanos continuaram um uso que existia antes deles. Perto do Mar a Lua brilha como um fogo. Fogo sobre a água mas também fogo sobre trovão. Dali vê-se tudo o que acontece no mar ali. A mesma deusa Lua e Água Astarté e Artemisa. Num só lugar adorava-se a ambas excesso de positividade. Falo entenda-se do culto da Lua especializado a Sintra».
(José Leite de Vasconcelos)
À minha filha Mariana Lampreia.
Á Cristina Duarte
A Pandora
Evas só conheço duas: a do “Paraíso Perdido” e do “Pecado Original” e uma Eva Cantarella que se dedica, já há muito, ao estudo da Mulher Romana.
E se os deuses ou figuras divinas espelham as sociedades, Eva será, no fundo, acabará por representar o que era espectácvel de uma mulher hebraica.
Tellus, a Geia grega, com os seus quatro filhos, provavelmente as Estações, acompanhada por Aeon-Cronos com o Zoodíaco.

«A Alma terra, por seu turno, rodeada que estava pelo mar,
entre as águas oceânicas e as fontes que, por toda a parte,
encolhidas, buscam refúgio nas escuras entranhas da mãe,
ergueu a custo, árida, até ao pescoço, o rosto sufocado;
e pondo a mão à frente da testa, com um enorme safanão
tudo fez estremecer. Instalando-se um pouco mais baixo
do que é costume, com voz alquebrada, assim falou:
«Se é isto que queres e mereci, que aguardam os teus raios,
ó deus supremo? Se vou perecer pela violência do fogo,
dá-me perecer pelo teu fogo para a desgraça ser mais leve,
sendo tu o autor (...)
Esta é a paga que me dás, esta a recompensa pela fertilidade
e os meus serviços, por eu suportar as feridas do arado
adunco e das enxadas, e por me afatigar o ano inteiro
por prover o gado de folhagens e a raça humana de cereais
(...)
Pois se consideração nem por teu irmão nem por mim te toca,
ao menos condói-te do teu próprio céu!
(...)
Se os mares, se as terras, se o palácio celeste perecerem,
voltamos à amálgama do Caos primordial. Salva das chamas
o que ainda restar, se ainda restar algo, e olha pelo universo».
Assim falara a Terra (já não conseguia mais aguentar
o calor, nem dizer nada mais). E enfiou de volta a cabeça
em si mesma e nos antros mais próximos dos defuntos.
Então, o pai omnipotente chama os deuses para testemunhar. (...)
Depois, sobe à cidadela lá no alto (...)
Troveja, e, balançando um raio junto à orelha direita,
dispara-o contra o cocheiro, cuspindo-o, a um tempo, da vida
e do carro. E assim, com o seu cruel fogo, extinguiu o fogo».
Ovídio, Metamorfoses, Livro II. Livros Cotovia, 2007.
Segundo outra versão, terá sido Atena (ou Deméter noutra lenda) a salvar-lhe o coração que ainda palpitava e, engolindo-o, a princesa tebana Sémele engravidou do segundo Dioniso.
Aceita-se ainda numa outra das versões que o coração de Zagreu tenha sido reduzido a pó que foi dado a beber a Sémele, que assim ficou grávida.
O filho de Zeus e da mortal Sémele viria a ser o famoso Dioniso, deus do vinho e da vinha, que, na verdade, era uma reencarnação do falecido Zagreu, conhecido entre alguns autores como o "primeiro Dioniso“. Por isso, ele é chamado “duas vezes nascido” ou “o de duplo nascimento” (dio-nisio).
Hera, ao ter conhecimento das relações amorosas de Sémele com o seu esposo Zeus, resolveu eliminá-la.
Transformando-se na ama da princesa tebana, aconselhou-a pedir ao amante que se apresentasse em todo o seu esplendor. O deus advertiu Sémele que semelhante pedido lhe seria funesto, uma vez que uma mortal não suportaria a epifania de um deus imortal. Mas, como havia jurado pelas águas do rio Estige jamais contrariar-lhe os desejos, Zeus apresentou-se com seus raios e trovões e ela morreu fulminada, salvando-se apenas o seu filho.
O feto do futuro Dioniso, foi salvo por Zeus que o recolheu do ventre de Sémele e o colocou na sua coxa, até que se completasse a gestação normal.
Mas o longo caminho de Baco não termina por aqui.
Temendo novo estratagema de Hera, mal nasceu o filho de Zeus, Hermes recolheu-o e levou-o às escondidas para a corte de Átamas, rei beócio, casado com a irmã de Sémele, Ino, a quem o menino foi entregue. Irritada, Hera enlouqueceu o casal que matou os seus filhos.
Zeus transformou o filho num menino (ou em bode, segundo algumas narrativas) e ordenou que Hermes o levasse para o monte Nisa, onde foi confiado aos cuidados das Ninfas e dos Sátiros, que lá habitavam numa gruta profunda.
Ainda assim a saga não termina e, enciumada, a deusa Hera transforma Baco já adulto num louco a vaguear pelo mundo.
Ao passar pela Frígia, foi curado e instruído nos rituais religiosos pela deusa Cibele. Na Frígia, conheceu Cíbele, deusa da natureza e abundância, que o curou e o iniciou em seus ritos religiosos.
Assim, Baco começou a juntar discípulos por onde andava, ensinou-os a cultura da vinha e os seus mistérios por toda a Ásia.
As ménades, também conhecidas como bacantes, lenai, tíades ou coribantes (estas últimas ligadas ao culto de Cibele na Lídia) são as seguidoras de Baco, participantes das orgias e aliadas nos seus confrontos com tiranos.
Buscavam a vida nos bosques e dedicavam-se à dança, a festins de embriaguez e dilaceramento de animais selvagens.
São normalmente representadas nuas ou vestidas só com peles de veado, com grinaldas de Hera e empunhando um tirso.
Na presença do deus, ficam imbuídas do seu poder e podiam atingir o êxtase.
Agradecemos a Graça Cravinho a fotografia e descrição acima.
«Zeus, rei dos deuses, tomou por primeira esposa Métis,
a que mais sabe sobre os deuses e os homens mortais.
Mas, quando ela estava prestes a dar à luz a deusa Atena de olhos garços,
nessa altura, ele enganou o seu espírito,
com palavras ardilosas, e engoliu-a no seu ventre,
por conselho da Terra e do Céu coberto de estrelas.
Ambos o aconselharam assim, para que o poder régio
não pertencesse a nenhum dos outros dos deuses
que vivem sempre, senão a Zeus.
Porque estava predestinado que dela nascessem filhos
muito inteligentes:
a primeira, a filha de olhos garços, a Tritogénea,
detentora de força e de uma sábia vontade igual à do pai;
depois seria a vez de um filho, rei de deuses e de homens,
que ela daria à luz, um filho de coração soberbo.
Mas, antes, Zeus engoliu-a no seu ventre,
para que a deusa lhe pudesse aconselhar o que é bom
e o que é mau»
(Hesíodo, Teogonia, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 2014)
Aracne será assim vítima da orgulhosa Atena que não consegue conceber que a sua tapeçaria seja menos bela do que a que ela havia concebido. A pobre Aracne termina por suicidar-se e Atena condoída acaba por transformá-la numa aranha.
Medusa ficou conhecida na Mitologia como por ser um mostro ctónico terrível, do sexo feminino, sendo representada com serpentes no lugar dos cabelos com o poder de petrificar apenas com o olhar.
Contudo Medusa não teria sido sempre assim. Seria uma mulher de corpo perfeito e de belos cabelos dourados. Ela e as duas irmãs eram virgens sacerdotisas de Atena, Deusa da guerra e da justiça. Poseidon, deus do mar, havia desposado Medusa (algumas versões dizem que ela foi violada) no templo de Atena. A Deusa furiosa pelo desrespeito praticado no seu templo castigou Medusa, transformando- a num mostro mortal. Os seus belos e invejados cabelos transformaram-se em serpentes, o seu corpo foi deformado e a pele criou escamas e ficou pegajosa, e os seus os dentes tinham o aspecto deum javali. Perseu, filho de Zeus com a ajuda de Atena, será o herói que decapitará Medusa, matando-a. Em seu auxílio vão Hades e Hermes que presentearam Perseu com um elmo, que o deixava invisível, sandálias aladas, um escudo feito de bronze brilhante, uma espada e ainda um alforje chamado quíbisis para poder carregar a cabeça cheia deserpentes. A sua cabeça será oferecida à justiceira Atena que,doravante, a usará na sua égide.
«Dela, quando Perseu lhe decepou a cabeça, Surgiram o grande Criasor e o cavalo Pégaso»
Hesíodo, Teogonia.
«Amigos, não devem só ou dois apenas conhecer
os oráculos que me revelou Circe, divina entre as deusas.
Mas vou eu dizê-los, para que conheçais, quer morramos,
quer escapemos à morte e evitemos o trespasse.
Ordena-nos primeiro que fujamos da voz doce das Sereias
e do prado florido. A mim só, exortou a escutar a sua voz».
Odisseia, (tradução e notas Maria Helena Rocha Pereira) in Hélade. 2009. Guimarães Editores.
dar-me alívio nesta minha paixão, caso eu pareça digno dele.
Ninguém sabe melhor que eu, ó filha do Titã, quão grande
é o poder das plantas, eu que, por meio delas, mudei de forma.
(...)
Mas, se algum poder há nas fórmulas mágicas, uma fórmula
recita nos teus lábios sacros; se forem mais potentes as ervas,
lança mão do poder comprovado de uma planta eficaz».
Ovídio, Metamorfoses, Livro XIV. Livros Cotovia, 2007
Por sua vez a vingativa Medeia, filha do rei Eates, da Cólquida, tão depressa é referida como sendo sobrinha de Circe, ou sua filha e de Hermes, ou mesmo sua irmã e filha ou sacerdotisa de Hécate (3.251-2. Argonáutica)., foi, por algum tempo, casada com Jasão, inscrevendo-se também no Ciclo dos Argonautas, que nos foi transmitido na obra Argonáutica de Apolónio de Rodes.
Também Medeia é feiticeira, detentora de poderes mágicos.
Na versão de Medeia de Séneca, ela é discípula de Hécate, reflectindo bem o poder da magia, tão em voga em Roma, no século I. Medeia, invoca, no texto as almas do mortos, as divindades infernais , o Caos e a morada de Hades.
Através da utilização de um unguento que Jasão deveria usar no seu corpo e escudo, ele torna-se invulnerável ao fogo e ao ferro, conseguindo assim lavrar o campo e enfrentar os touros que deitavam fogo pelas narinas e agricultar as terras onde semearia os dentes de um dragão.
Ao que nos contam algumas narrativas deste mito, Hera, protectora de Jasão, havia interferido junto de Afrodite para que convencesse Eros a fazer com que Medeia se apaixonasse por Jasão e a colocar-se a seu lado, casando-se ele com ela como reconhecimento desse afecto.
MEDEA e TRIPTOLEMUS
Munique
Medeia acautela-o de que dos dentes de dragão nasceria uma seara de soldados que o tentariam matar, encontrando uma solução que ajudasse a dispersar esses mesmos soldados: lançar uma pedra, de longe, para o meio do exército. Como Jasão conseguiu executar com êxito as tarefas, regressou para reclamar o velo de ouro a Eetes.
Painel do Mosaico das Musas, Villa Romana de Torre de Palma, MNA)
Fotografia: Foto DDF/DGPC
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É uma Divindade tríplice, ou seja, possui três aspectos: anciã; deusa mãe e ao mesmo tempo virgem. É frequenemente representada com três cabeças, ou três corpos.
A sua tríplice divindade manifesta-se através do domínio do céu, do mar e da terra (e também do infra-mundo).
Uma das importantes referências sobre a divindade deve-se a Hesíodo na sua Teogonia, sendo retomado séculos mais tarde nas Metamorfoses de Ovídio (Metamorfoses, Livro VI, 140, Livros Cotovia, 2007).
Mas também Séneca, na sua Medeia nos remete aos poderes de «Hécate triforme, que ofereces um fulgor cúmplice aos mistérios silenciosos» Medeia, Séneca, Tradução, Introdução e notas: Ricardo Duarte. Edições Sá da Costa, 2010.
As narrativas mitológicas as Mulheres (como nos homens aliás) são, portanto, na Antiguidade Clássica, veículos de interpretação de um universo que se pretende descritível, “explicável” e, deste modo, enquadrados numa “religião racional”.
Entre os Titãs, ou “deuses primitivos” encontra-se Mnemosine, que significa “Memória”. Mnemosine era filha de Geia (que personifica a terra em formação, gerada do nada, mãe e esposa de Urano, com o qual constitui o primeiro casal divino) e mãe das nove Musas a que nos dedicaremos noutro local. Aqui:
Três musas baixo-relevo de Mantineia atribuído ao escultor de Praxíteles, século IV a. C.
No entanto, podemos relembrar tantas outras que desempenharam um papel crucial na mitologia e na própria literatura, A tradição clássica consagrou para a posteridade uma extensa galeria de figuras femininas. «Notáveis pela auréola mítica (…),essas mulheres tiveram seus nomes transformados em símbolos, em estereótipos dos quais a arte, nas suas diversas formas de expressão, em todos os tempos posteriores, apropriou-se, tornando-os património comum da humanidade», referindo, a título de exemplo, Afrodite, Andrómaca, esposa de Heitor, Andrómeda, Antígona, Ariadne, Ártemis, Atenas, Aurora; as Bacantes; as Camenas, Calíope, Calipso, Cibele, Cíntia, Circe, Clio, Dafne, Deméter, Dido, a épica e trágica personagem que Virgílio imortalizou na Eneida , a amante apaixonada de Eneias que vítima da urdidura de Vénus e Juno, divindades cujo ciúme e vaidade tecem o enredo da sua paixão, Diana; Electra, Eurídice, Europa; Fedra, as Fúrias, Górgona; Harmonia, as Harpias, Helena, Hera; Ifigênia, Io; Jocasta, Juno; Leda, Medeia, Medusa, Melpômene, as Mênades, Minerva, Moira, as Musas; as Nereidas, as Ninfas que habitavam os campos e bosques, levando alegria e felicidade.; as Parcas, Partênope, Pasífae, Penélope, Perséfone, Pirra, Políxena, Prosérpina; Quimera, essa mistura de leão e cabra que soltava fogo pelas ventas.
Citação a partir de REPRESENTAÇÕES DA MULHER NA POESIA LATINA, Aécio Flávio de Carvalho. Aqui .
Do mito de Prosérpina, (do latim proserpere, ‘emerger’), uma antiga divindade de origem grega, Perséfone, que assume simolicamente a vida, a morte e a ressurreição, nos fala Claudiano, nos séculos IV-V, em o «Bordado de Prosérpina». Assim nos diz o autor:
O Bordado de Prosérpina, Claudiano (Séculos IV e V)
«Com maviosos cantos deleitava
estes sítios a terna Prosérpina:
e para a mãe, que em vão saudosa espera,
um presente tecia, primor d’arte.
Co’a destra agulha desenhava, astura
o trono de seu Pai, celeste assento.
Engenhosa na tela figurava
dos Elementos a constante série;
a Natureza o caos arranjado,
e em seu justo lugar as cousas pondo;
fixando onde compete o que é mais leve;
fazendo gravitar o que mais pesa;
encandilando o éter; e obrigando
sobre um ponto a girar o céu c’os astros;
fica fluido o mar; sólida a terra,
suspendida no espaço ilimitado.
Tinge os raios da luz com várias cores
e acende as estrelas num céu d’ouro.
Sobre um leito azulado as ondas brincam;
as preciosas pérolas que alvejam
crescem nas paias, e por arte os fios
se levantam, fingindo crespas ondas.
Parece que nas rochas s’espedaçam
as marítimas plantas, verdes algas;
que se ouve o som das águas, murmurando,
quando serpeiam pela solta areia.
Ali bordou também as cinco Zonas;
e c’um rio de púrpura assinala
o sítio onde o calor mais permanece».
Roma – Claudiano (c. 370 – 404). A partir de Tradução de Marquesa de Alorna.

Legenda e fotografia a partir de Aqui
Na Grécia Antiga, celebravam-se em Elêusis, localidade próxima de Atenas, sendo considerados os de maior importância entre os que se celebravam na Antiguidade, os mistérios de Elêusis (também conhecidos como mistérios eleusinos) que eram ritos de iniciação ao culto das deusas agrícolas Deméter/Ceres e Perséfone/Proserpina.
Neles se reflete o culto da Grande Mãe, trazido do Egito através de Ísis.
Estes mitos e mistérios de Ísis foram adoptados pelo Império Romano e tiveram uma grande expansão atingindo os pontos mais distantes do império e penetrando profundamente em todas as classes socias, desde o próprio imperador, às elites, como o demonstram a presença de templos privados dedicadas ao culto de Isis nas propriedades aristocráticas, em Pompeia e diversas cidades romanas.
Mas, sabe-se que também era cultuada entre os escravos.
Lembramos que no Santuário de Panóias está atestado o culto a Serápis e Ísis.
Os ritos, realizados à noite, e as crenças eram guardados em segredo, só transmitidos a novos iniciados, ou neófitos.
Ísis assim nos é retratada por Apuleio, no seu «Asno de Ouro»:
O culto desta divindade egípcia está atestado na Hispânia, no anfiteatro romano de Itálica (Santiponce, Sevilla), em Clunia (Peñalba de Castro), em Baelo Claudia e em Molinete de Cartagena.
Faz parte das divindades protectoras quer do indivíduo, quer da vida pública, algumas das quais permaneceram na nossa memória, através de palavras que nos são conhecidas.
A cornucópia ou corno da abundância é um dos seus atributos.
Lembro ainda que, em Roma, a expressão “religiões de mistérios” se refere, normalmente, ao culto de Ísis, Mater Magna ou particularmente Mitra, de Dioniso Baco, e, igualmente, ao culto de Elêusis, representante dos mistérios propriamente ditos, os mistérios de Elêusis, ritos de iniciação ao culto das deusas agrícolas Deméter e Perséfone/Proserpina e que se realizavam na cidade grega, nas proximidades de Atenas, considerados os de maior importância entre todos os que se celebravam na Antiguidade.
Estes mistérios foram adoptados pelo Império Romano, os ritos eram guardados em segredo, só transmitidos aos novos iniciados.
Deméter e sua filha, Perséfone, (Ceres e Proserpina entre os Romanos) presidiam aos pequenos e aos grandes mistérios.
antes de confirmar as têmporas com retorcido com
e, dançando livremente, entorno cânticos a Ceres".
Livros Cotovia. 2019 .Tr.e notas Gabriel A. F. Silva)
Clio, com lira ou aguda tíbia?
Que deus? De quem o nome que o jocoso eco
ressoar fará
ou no topo do Pindo, ou sobre o gélido Hemo,
de onde temerárias as árvores seguiram
o canoro Orfeu,
as céleres correntes e os ventos velozes,
com a melodiosa lira sedutoramente conduzindo
os atentos carvalhos?
ele que dos assuntos dos homens e dos deuses,
ele que o mar, e a terra e o céu com as diversas
estações governa?
nem ninguém tem uma força semelhante ou próxima;
vizinhas honras detém, todavia, Palas,
corajosa na batalha.
nem sobre a Virgem das feras inimiga,
nem sobre ti, Febo, tu temível
com tuas certeiras flechas»
Os mistérios elêusinos celebravam o regresso de Perséfone, visto que era também o regresso das plantas e da vida à terra, depois do Inverno, e as sementes que a deusa trazia significavam o renascimento de toda a vida vegetal na primavera.
Se o povo reverenciava em Deméter a terra-mãe e a deusa da agricultura, os iniciados viam nela a luz celeste, mãe das almas e a Inteligência Divina, mãe dos deuses cosmogónicos. Os sacerdotes de Elêusis ensinaram sempre a grande doutrina esotérica que lhes veio do Egipto.
Ao que diz a lenda, o ritual dos Mistérios de Elêusis reporta ao facto de a deusa Perséfone, filha de Deméter, ter raptada por Hades (Plutão), rei do Mundo Inferior, quando colhia flores com suas amigas, as Oceânidas.
Deméter, ao tomar conhecimento do rapto, ficou tão amargurada que deixou de cuidar das plantações dos homens aos quais havia ensinado a agricultura, originando a fome. Os homens morriam assim esfomeados, até que Zeus (Júpiter), que havia permitido que o seu irmão Hades, o deus dos mortos e das profundezas, raptasse Perséfone fazendo-a sua esposa e vivendo com ela nas entranhas da Terra, resolveu reparar o mal cometido.
Decidiu, então, que Perséfone deveria voltar à superfície da Terra durante seis meses para visitar a sua mãe e outros seis meses passaria com Hades, originando o ciclo das colheitas e da Natureza. (cit. Filomena Barata, Religiões Mistéricas) Aqui
Relevo do Século V a.C. Museu Arqueológico de Atenas.
Legenda e Fotografia a partir de Aqui
Não resisto pois a citar: «O mundo mediterrâneo cultuou muitas imagens da Grande Deusa Mãe. Seu nome varia conforme sua nacionalidade, todavia, ela é a mesma Mãe Bondosa: como a egípcia Ísis, a cretense Gaia, a micênica Rea, a eleusina Deméter, a ateniense Hera, a cipriota Afrodite, a frígia Cibele, a efésia Ártemis, a síria Dea, a persa Anaitis, a babilônia Isthar, a fenícia Astarte, a Cananéia Atargatis, a capadócia Mâ e as trácias Bendis e Cottyto; e Mãe Terrível, como as germânicas Nornas, s gregas Moiras, as romanas Parcas, a hebraica Lilith, de quem derivou variadas personificações dos horrores femininos, como Górgonas, Fúrias ou Erínias, Keres, Sereias, Harpias, Lâmia, Êmpusa, Circe, Cila, Caríbdis e Sin, dentre outras. Todas estas faces da Deusa são formas de manifestação de uma pluralidade de figuras malévolas da Grande Mãe difundidas pela humanidade ao longo dos tempos através dos rituais religiosos, dos mitos e da literatura. Tais imagens simbolizam o poder primordial do Grande Feminino em seu papel de gerar, proteger e devorar, funções representativas das formas e dos fenômenos da Natureza: montanhas, labirintos, florestas, abismos, rios, mares, oceanos, fontes, lua, etc., que conectadas a figuras de animais, representam a grande diversidade simbólica do corpo da Deusa».(…) A mais elevada sabedoria feminina é transmitida pelo mito da Deusa tríplice Deméter/Perséfone/Hécate. Deméter, nome grego, Delta, significa Deusa Mãe com tripla face: a jovem, a mãe, a velha. Seus nomes adquirem o significado dos seus papéis arquetípicos de mãe bondosa e terrível: Deméter, a que conhece a imortalidade, capaz de dar a juventude eterna; Hécate, a que vê no escuro; Perséfone, a que conhece o segredo da morte; Tiamat, o oceano gerador; Maat, a pena branca da verdade; Medusa, a que tem um olhar petrificante; Fata Morgana, a que leva os homens ao seu destino; Sofia, a que tem a sabedoria superior; Brigit, a responsável pelo ciclo das estações; Kali, a que destrói os homens para dar forma à criação; Syrian Mari, aquela capaz de examinar a alma; Sibila, a vidente capaz de ver o futuro.
O mito das Deusas se resume na trajetória da mãe que perdeu a filha e a busca sem trégua. Deméter, filha de Cronos e Rea, deusa grega da terra cultivada, especialmente do trigo teve uma filha com seu irmão Zeus, Coré. Ainda adolescente, Coré saiu pelos campos a colher flores. A terra abriu-se para Hades, o deus do Inferno, irmão de Zeus, e, por conseguinte, tio da jovem deusa, que a raptou. Coré gritou, a mãe ouviu e veio socorrê-la, só que chegou muito tarde. Hécate, que tudo via, contou à mãe aflita o que havia ocorrido. A partir de então, Deméter passou a percorrer o mundo à procura da filha, sem comer, beber ou repousar, abstendo-se de fazer germinarem as sementes semeadas na terra até que sua filha aparecesse».Cit. in. «As Faces e o significado arquetípico da deusa na vida e na arte»
Maria Goretti Ribeiro, Universidade Estadual da Paraíba
Aqui
E, claro está, não podemos deixar no esquecimento Tellus, a Geia grega, aqui representada com os seus quatro filhos, provavelmente as Estações, acompanhada por Aeon-Cronos com o Zoodíaco, é era a deusa da Terra, o solo fértil.
Não esqueçamos ainda as divindades da Natureza e à Floresta, a exemplo de Flora. Mas também que, em Roma existia o festival Opalia ou Opiconsiva, no dia 25 de Agosto, em honra da deusa Ops, uma divindade ligada aos recursos agrícolas, à riqueza e à abundância. Marcava o fim do período das colheitas.
Ou as que se relacionam com o Mundo Cósmico, a exemplo de Phoebe ou Silene, a deusa da Lua.
De Afrodite nos narra Hesíodo que foi nascida da espuma do orgão imortal do Céu, cortado pela foice de Cronos:
«Os testículos, por sua vez, assim que cortados pelo aço
e lançados desde terra firme ao mar de muitas vagas,
forem levados pelo mar, por longo tempo; à sua volta, um branca
espuma se libertou do orgão imortal e dela surgiu uma
rapariga. Primeiro, foi em Citérios
que ela nadou, e de lá em seguida chegou a Chipre rodeada de mar;
aí aportou a bela e celebrada deusa que, à sua volta,
sob os seus pés ligeiros, fazia florescer o solo, Afrodite
(a deusa nascida da espuma e Citereia de belo toucado)
é esse o nome que lhe deram os deuses e homens, porque na espuma
surgira, e ainda Citereia, por ter aportado junto dos Citérios,
e Ciprogeneia, por ter nascido em Chipre rodeada de ondas,
e ainda Filomedeia, porque surgida dos testículos,
Seguiu-a, sem demora, Eros e acompanhou-a o belo Desejo,
mal ela nasceu e se uniu à família dos deuses.
E, desde o início, teve como competências e foi
seu destino, entre os homens e os deuses imortais,
as intimidades das meninas, os sorrisos, os enganos,
o prazer doce, o amor, a meiguice».
Hesíodo, Teogonia, 2014, Imprensa Nacional - Casa da Moeda
Conta-nos Seutónio, que o Divino César, anunciando a sua própria divinização, em discurso fúnebre de Júlia, sua tia, efectuado na tribuna do forum, elogiou a própria ascendência e do seu pai da seguinte forma: «Por sua linha materna, a minha tia descende de reis; pela linha do seu pai remonta aos deuses imortais. Pois de Aneo Marcio, que que procedem os reis Marcios, é a linhagem de sua mãe; é de Vénus que descendem os Julios, que constituem a nossa família». (Suetónio, Vida de los Doce Césares, “El Divino César”, Colección “Libros de Bolsillo Z”, 1985, Barcelona.
Conta a lenda que Hesíodo pastoreava os seus rebanhos no Hélicon quando as Musas se lhe dirigiram afirmando que sabiam mentir e revelar a verdade. Deram-lhe um ramo de loureiro e iniciaram-no, deste modo, como poeta. E foi deste modo que ele contou as origens ancestrais dos deuses.
As Musas que moravam afastadas das outras divindades, viviam com as Graças e com Hímero, o duplo de Ero, e entoavam pelos caminhos do Olimpo um canto imortal e tinham também um local de dança no cume do Hélicon e do altar de Zeus.
Sempre que percorriam os caminhos em direcção ao Olimpo iam envoltas em nuvens, podendo assim ainda melhor soar as suas vozes.
«O mnémon, etmologicamente, significa “aquele que lembra” é a memória da Diké (justiça), ou seja, é o responsável pela preservação da lembrança de uma decisão judicial do passado (Le Goff, 1992, p. 20).
«Entretanto, o papel do mnémon não se restringe ao aspecto judicial, ele poderia ter também uma função religiosa, técnica, política-religiosa ou ainda organizar o calendário»
(…)
Na lenda, o mnémon é apresentado como um servidor de heróis, que tem como função rememorar constantemente uma senha divina ao seu senhor, esta deve ser relembrada ao seu mestre de memória, e o seu esquecimento causava a morte»
(Vernant, 1999). Cit. in: Keila Maria de Faria, Medéia e Mélissa: Representações do Feminino no Imaginário Ateniense do Século V a.C.
http://pos-historia.historia.ufg.br/uploads/113/original_faria_keilaMariade.pdf
Poderíamos recordar também as Camenas, Camenae, divindades itálicas, originalmente deusas da primavera e das fontes, ou ninfas das águas de Vénus e do Lácio. Eram sábias e profetizavam o futuro.
Mais tarde, foram identificadas com as musas gregas, como também Ovídio se lhes refere.
«Com o espírito instruído (…)
Mas sobre as Musas, tal como das restantes divindades, existem múltiplas histórias. Assim se refere Cícero:
«Quanto às Musas, as primeiras são quatro, filhas do segundo Júpiter e são Telxínoe, Aede, Arque e Mélete; as segundas são nove, filhas do terceiro júpiter e de Mnemósine; as terceiras são as filhas de Píero e Antíope, que os poetas costumam chamar piérides ou Piérias, e têm os mesmos nomes e o mesmo número das que foram atrás citadas»
Lembremos ainda as Sirenas, «Sirenas Hijas del dios Aqueloo y de una musa, eran mitad ave, mitad mujer. Tenían una maravillosa voz con la que compitieron contra las musas. Estas últimas ganaron y les arrancaron las plumas. Las sirenas avergonzadas, se retiraron a las costas sicilianas. Con su canto atraían a los marineros, quienes, sin poder sustraerse a su canto, se estrellaban contra las rocas (Od. XII 36-54; 181-200). Cit: El Arte de las Musas: La Música Griega, desde la Antiguedad hasta hoy, Amor López Jimeno. VI JORNADAS DE HUMANIDADES CLÁSICAS HOMENAJE A MARIANO FERNÁNDEZ-DAZA Y FERNÁNDEZ DE, CÓRDOVA 10-11, 17-18 de febrero de 2006.
que junto delas abordarem.
Seja quem for que se aproxime incauto e escute
a voz da Sereias, a esse nem a mulher nem os filhos inocentes
hão-de acolhê-lo e alegrar-se com o seu regresso a casa.
Com o seu canto melodioso, as Sereias que estão no prado
hão-de fasciná-lo; em volta, um montão de ossos
de homens putrefactos, com a pele a engelhar-se.
Mas tu passa adiante! Amassa cera doce como o mel,
tapa com ela os ouvidos dos companheiros, não vá alguém mais
escutá-las. Tu, porém, se queres poder ouvi-las,
que eles te atem de pés e mãos na nau veloz,
bem direito, no cavalete do mastro. A ele ficarás amarrado
por cordas, a fim de escutares com deleite a voz das sereias»
E ainda podemos referir-nos a Artemisa/Diana, filha de Zeus/Júpiter e Latona, irmã gémea de Apolo, e do seu importante papel de protectora da Natureza, dos bosques e da vida animal. Ela foi a deusa da çaça, mais também protectora das donzelas, da maternidade e da saúde das mulheres. Era representada geralmente como uma caçadora levando um arco e flechas. O cervo e o cipreste estavam-lhe consagrados.
Em Agosto honrava-se Diana.
A infatigável Diana, deusa da lua e da caça, era ciosa da sua castidade, ao ponto de transformar num cervo o caçador Acteão, apenas porque a viu nua durante o banho. Era acompanhada por um séquito de sessenta oceânidas e vinte ninfas que, como ela, renegaram a sexualidade.
Cedo foi associada a Ártemis ou Artemisa, a deusa virgem da mitologia grega, também protectora da vida selvagem e da caça, que os tempos quiseram associar à lua e à magia, bem como aos animais selvagens e às parturientes.
Recordemos ainda Salus, filha do deus da saúde Esculápio, ou também Bona Dea, divindade relacionada com fertilidade feminina. Associada também à cura, muitos pacientes eram tratados no seu templo com ervas medicinais. Era venerada com grande fervor quer por plebeus, escravos, libertos e mulheres. Invocavam-na para pedir saúde e libertação da escravatura. As mulheres pediam fertilidade. O seu culto era muito antigo e incluía ritos reservados exclusivamente às mulheres.
A divindade era adorada num templo no Monte Aventino, mas os ritos secretos em sua honra praticam-se num local indicado por um magistrado, na sua própria casa, a 4 de Dezembro. Eram dirigidos pela mulher do magistrado, ajudada pelas virgens vestais, sendo proibida a participação dos homens, nem se permitiam pinturas com figuras masculinas, fossem humanas ou animais.
A habitação deveria ser ornamentada com flores e plantas, excluindo-se a o mirto já que segundo a mitologia Bona Dea havia sido golpeada até à morte por Fauno com um ramo de mirto, por teu ousado beber vinho.
A cerimónia é mal conhecida, mas sabe-se que está relacionada com a Agricultura.
E ainda a Fides, cultuada pelos romanos, que nos faz concluir que os juramentos movidos pela fides não o eram apenas por princípios de ordem ou por um valor, mas também por aspectos divinos.
Para os romanos “fides” é um conceito fundamental que remete a aspectos políticos, sociais e jurídicos e, genericamente, referia-se ao juramento que obrigava ao cumprimento de um dever, um pacto que implicava o seu cumprimento para com um indivíduo, a família, os deuses ou a pátria.
Ou a Virtus, mulher de coragem e valor militar, acompanhante do deus romano da ética e nonra militar, que se apresentava como um jovem guerreiro usando uma lança e uma cornucópia, e que, a par da Gloria; Libertas; Pietas, simbolizando o respeito religioso; a Fides; Dignitas e Maiestas, representando a Grandeza do Povo Romano, se assumem como os grandes valores do Cidadão de Roma.
Mas não podemos deixar de referir algumas das divindades de origem africana que chegaram, se bem que tardiamente a ter lugar no Capitólio romano, a exemplo de Dea Africa, cujo culto estava associado à Tanit cartaginesa, protetora e Genius de África, logo, implicada em todas as atividades da vida dos antigos africanos. «Ela foi associada ao princípio feminino, que presidia a fecundidade da terra, o que se evidencia através de um de seus atributos: a cornucópia.
No final do século II, Tertuliano, em Apologética XXIV, 7, citou Africae Caelestis como uma divindade da região norte-africana. Esta grande divindade feminina tornou-se a patrona da África e, notadamente, de Cartago, uma das principais cidades norte-africanas e do Mediterrâneo Ocidental. O célebre templo à deusa e seu oráculo persistiram em Cartago até 421. A deusa foi protegida e inclusive privilegiada pelos romanos em Cartago, segundo a Regra XXII, 6 de Ulpiano: “deos heredes instituere non posumus praetere … Caelestem Salinensem Carthagini”. No século III, a imperatriz Júlia Domna, esposa do Septímio Severo, imperador de origem norte-africana, foi identificada com a divindade africana numa inscrição de Magontiacum (CIL XIII, 6171) e representada como tal (sobre esta imperatriz, ver GONÇALVES, 2002: 160-190). Em 221, o então imperador Heliogábalo, também pertencente à domus severiana, deu-lhe um lugar em Roma junto com Sol Inuictus (Herodiano V, 6, 4), o que, segundo o autor, foi aparentemente uma boa ocasião para transladar o tesouro cartaginês da deusa. Seu templo no Capitólio romano manteve-se pelo menos até 259 (ILS 4438). Entretanto, em certas passagens da documentação textual literária, o culto a Dea Africa aparece em algumas ocasiões como hostil ao governo de Roma. Na História Augusta (Vida de Pertinace IV, 1-2), há uma passagem que faz referência a rebeliões sufocadas na África por Pertinace em fins do século II, que foram inspiradas pelas profecias emanadas do templo da deusa», embora haja controvérsias quanto a esta passagem, pois, ao que é sabido, há uma corrupção do texto.
O mosaico é constituído por um «medalhão central quadrilátero: envolvido numa moldura octogonal curva florida um busto feminino; a mulher tem pele morena com cabelo frisado com cachos até a base de seus ombros, veste uma túnica sem mangas com nós nos ombros e cobre a cabeça com uma cabeça de elefante.
.quatro medalhões angulares circulares: cada um contendo um busto feminino diferente: uma mulher de pele clara com cabeça velada com ramos de oliveira; outra, coroada com flores; outra, coroada com espigas de trigo e outra, com ramos de parreira.
· quatro fusos laterais: cada um contendo um pássaro bicando: uma uva, uma flor, uma espiga de trigo e azeitonas.
E haverá ainda que recordar a importância do Mito da Europa, que segundo a mitologia grega, foi raptada por Zeus que se transformou em touro para seduzir a princesa, quando esta se banhava na praia. A princesa Europa terá nascido no mediterrâneo e era flha de Agenor, o rei fenício de Sídon, trazendo do Oriente para o Ocidente tudo o que lá aprendera.
O estatuto de Eva é, bem mais ambíguo, pois a sua personagem tendo contornos bem definidos na narrativa bíblica, como acima referimos, foi esbatendo o seu valor fortemente simbólico. Nascida (como, aliás, algumas divindades da mitologia greco-romana) do corpo de um homem que, apesar de ter podido presenciar o divino antes do “Pecado Original”, não o é, Eva é apenas a “Mulher”. Aparecendo num primeiro momento como agente a par do Homem pois «Deus criou o ser humano à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; Ele os criou Homem e Mulher», é, contudo, ela que provoca com a sua curiosidade a tentação e o “Pecado Original” , simbolizando ao mesmo tempo a sabedoria e a vida, através dos seus atributos como a serpente a a Árvore Sagrada, Eva rapidamente é transformada num ser de estatuto secundarizdo e e submisso, cuja função primordial é procriar, sendo que essa função é ela própria um estigma, pois um dos castigos que lhe é infringido é “a dor da gravidez”.
Torna-se também num mero objecto da dominação masculina, pois o anátema que sobre ela caiu foi proferido pela voz divina, que lhe é alheia e superior: “terás desejo ardente de teu esposo, e ele te dominará”.
Lembremos as palavras de Tertuliano:
Ao contrário, na mitologia greco-romana as divindades femininas são bem mais afirmativas, agentes ou adjuvantes em todo o enredo das(es)/histórias que se geram em seu torno: Hera, filha dos Titãs Oceano e Tétis, é o centro de uma trama onde o ciúme e a vingança obtida com uma ira implacável chegam a perturbar o próprio “deus dos deuses”.
No entanto, pese embora a sua personalidade, ou por isso mesmo, ela é também a protectora das casadas ou das parturientes, tendo gerado Ilitia, que acabará por zelar por estas últimas.
Atena, a virgem, que não foi gerada por uma mulher, porque brotou da cabeça de Zeus, é também feroz. Protectora da agricultura e das actividades artesanais, esta deusa tudo fará, contudo, para salvar a “Cidade”, mesmo que seja através da guerra. A deusa do Amor e da Beleza, Afrodite, é, por sua vez, capaz de todos seduzir, deuses ou mortais.
A montanha, a caverna, os ambientes rochosos são os ambientes escolhidos por essa Grande Mãe ou mesmo considerados a encarnação da Divindade.
Cíbele era normalmente representada como uma mulher madura, coroada de flores, nomeadamente rosas, aliás as flores utilizadas para venerar os mortos, e espigas de cereais, símbolo da vida, trajando uma túnica multicolorida e com um molho de chaves na mão.
O culto de Cibele tornou-se tão popular que o senado romano, pese sua política de tolerância religiosa praticada, viu-se forçado a proibir os rituais da deusa-mãe. Tal como as deusas Perséfone e Deméter, Cíbele pertencia à Religião dos Mistérios e os rituais que lhe eram dedicados eram celebradas à noite, uma vez que ela era considerada a Rainha da Noite. Era-lhe reconhecida uma profunda sabedoria que era partilhada apenas com os seguidores dos seus «Mistérios».
Os que se dedicavam ao seu culto eram considerados como que encarnações de seu filho Átis, um deus lunar que usava a lua crescente como uma coroa, que tanto era tido como seu filho, como amante de Cíbele, a deusa da Lua.
Vergílio assim se lhe refere:
flutuando no ar transparente do Verão até junto dos astros do céu
e te maravilhares com a sua nuvem escura arrastada pelo vento,
observa-as bem. Elas procuram sempre águas doces
e protecções frondosas. Aí espalha as essências prescritas:
erva-cidreira triturada e a vulgar erva da borragem, faz
barulhos estridentes e toca à volta os címbalos da Grande Mãe».
25—45 CE.
120 × 80 cm.
Inv. No. 8845.
Naples, National Archaeological Museum, Hall LXXI
(Napoli, Museo archeologico nazionale di Napoli, Sala LXXI)
Fortuna é uma dessas deusas, a do destino e da sorte (boa ou má) e da esperança como acima se referiu. Adquire os atributos da divindade grega Tique.
Temida entre os Romanos, pois dela dependia, segundo os seus caprichos, a riqueza ou a pobreza, o poder ou a servidão, Fortuna comanda todos os acontecimentos da vida dos homens, motivo pelo que tem como atributo um leme.
Fazia-se, assim, representar com uma cornucópia e um timão, simbolizando reciprocamente a distribuição de bens de forma mais equitativa e uma certa orientação do Homem cujos desígnios eram de certa forma aleatórios.
A Fortuna Alada proveniente de Pombalinho e pertence ao acervo do Museu Nacional de Arqueologia é um notável exemplar do século II d.C. e ainda o de Torres Novas.
Fortuna era considerada filha de Juúpiter/Zeus, sendo-lhe dedicado um festival, a 11 de Junho, em sua homenagem, o Fors Fortuna. O O seu culto foi introduzido por Sérvio Túlio, e foi-lhe dedicado um templo na época republicana, Fortuna Virilis, próximo do Capitólio.
Apesar dessa filiação/irmandade entre as divindades mimetizar, de certa forma, a situação bíblica, pois também Eva nasce da costela de Adão e dele se tornar concubina, não haver ter qualquer equivalência no que diz respeito ao protagonimo assumido pelas personagens.
E poderíamos ainda falar das Vitórias, as Aladas que ladeando Atena garantiam a vitória da Cidade nas suas conquistas e por isso era sempre associada aos Jogos Olímpicos.
No Museu da Batalha pode encontrar-se um exemplar notável.
Mas também Flora usa a cornucóia, como símbolo da Abundância.
Não esqueçamos também Pandora, «a protagonista da epopeia didáctica, exprime uma concepção negativa do feminino, sendo o primeiro sinal declarado de misoginia na cultura grega. Facilmente se conclui que através dela todas as desgraças invadiram o mundo. Aliás, na elaboração do mito de Pandora é possível detectar uma estrutura retórica que coloca lado a lado as vantagens de ser homem e as desvantagens de ser mulher: ao género masculino corresponde a cultura, a civilização, a guerra, a política, a razão e a luz, numa palavra, a ordem ou o cosmos; ao género feminino corresponde a natureza, a misantropia, a actividade doméstica, a imoderação, a noite, numa palavra, o caos ou tudo o que põe em perigo a ordem estabelecida. Aliás, Hesíodo usa mesmo o termo genos para se referir à mulher, o que significa que o autor considera o feminino um género distinto do humano» (Amílar Guerra, op. cit. p: 88).
Ou lembremos «Virtudes» da Antiga Roma, de que apenas, entre tantas outras, destacaremos Dignitas, Gravitas, Veritas, Salubritas Pietas, normalmente traduzida como “dever” ou “devoção,” que seja o dever para com as divindades e com a família – particularmente com o pai que se assume como uma extensão da comunidade – e para com o Estado. Portanto, mais do que a piedade religiosa, assume-se como um respeito pela ordem natural social, política e religiosa, bem como de patriotismo.
Mas não podemos omitir ainda as múltiplas divindades ou alegorias protectoras, a exemplo do que poderia representar esta figura feminina, proveniente de Pompeios, onde muito possivelmente o “clipeus” tem funções apotropaicas.
http://www.novaroma.org/via_romana/virtues.html.pt
Informação a partir de aqui
De salientar, contudo, que o papel desempenhado genericamente pelos seres femininos na mitologia grega se contrapõe, em alguns aspectos, à condição a que é remetida efectivamente a mulher ateniense, não lhe conferindo apenas o Geniceu, tal como, aliás, não parece ter acontecido em Esparta, onde as Mulheres viviam mais para o exterior, contribuindo, através das actividades a que se dedicavam, para o desenvolvimento da vida social desse Estado, em geral, tendo as cidadãs uma educação bastante completa.
«O arquétipo da Deusa é sempre projetado em uma bela mulher, amante, heroína, admirada por suas virtudes: a mãe bondosa, a princesa elegante e educada, a rainha obediente, a fada madrinha, de acordo com a forma que esse sujeito pode assumir no contexto da narrativa, da tragédia, do poema, da vida, mas nunca em mulheres do povo: mãe sofrida, profissional, prostituta. A personagem sempre encarnará um perfil emoldurado no campo da energia psíquica que o arquétipo inspira, informando os tipos, as atitudes, o comportamento cotidiano e os ideais da Deusa. Dessa forma, as heroínas da literatura, do cinema, das novelas de televisão, dos contos de fadas que personificam, não raro, os arquétipos de Afrodite, no modo de ser de uma mulher apaixonada; de 210Atena, nos ideais de uma mulher racional; de Deméter, na proteção materna, representam mitologemas atualizados por meio da literatura que fundamentam sempre novos aspectos do Feminino e abrem discussões sobre o equilíbrio psico-espiritual de nossa cultura, principalmente sobre as resistentes forças vitais femininas que sobrevivem no tempo (…).
A mais elevada sabedoria feminina é transmitida pelo mito da Deusa tríplice Deméter/Perséfone/Hécate. Deméter, nome grego, Delta, significa Deusa Mãe com tripla face: a jovem, a mãe, a velha. Seus nomes adquirem o significado dos seus papéis arquetípicos de mãe bondosa e terrível: Deméter, a que conhece a imortalidade, capaz de dar a juventude eterna; Hécate, a que vê no escuro; Perséfone, a que conhece o segredo da morte; Tiamat, o oceano gerador; Maat, a pena branca da verdade; Medusa, a que tem um olhar petrificante; Fata Morgana, a que leva os homens ao seu destino; Sofia, a que tem a sabedoria superior; Brigit, a responsável pelo ciclo das estações; Kali, a que destrói os homens para dar forma à criação; Syrian Mari, aquela capaz de examinar a alma; Sibila, a vidente capaz de ver o futuro. O mito das Deusas se resume na trajetória da mãe que perdeu a filha e a busca sem trégua. Deméter, filha de Cronos e Rea, deusa grega da terra cultivada, especialmente do trigo teve uma filha com seu irmão
Zeus, Coré. Ainda adolescente, Coré saiu pelos campos a colher flores. A terra abriu-se para Hades, o deus do Inferno, irmão de Zeus, e, por conseguinte, tio da jovem deusa, que a raptou. Coré gritou, a mãe ouviu e veio socorrê-la, só que chegou muito tarde. Hécate, que tudo via, 211contou à mãe aflita o que havia ocorrido. A partir de então, Deméter passou a percorrer o mundo à procura da filha, sem comer, beber ou repousar, abstendo-se de fazer germinarem as sementes semeadas na terra até que sua filha aparecesse.
Passando por Elêusis ela se disfaçou numa velha e pela primeira vez descansou. Dirigiu-se à morada de Celeu, rei da região, onde incógnita parassou a trabalhar como ama de Triptólemo. A deusa tentou imortalizar este menino, mas não conseguiu por causa da intervenção de Metanaira, mãe do garoto. Nessa ocasião Deméter revelou sua identidade e ensinou aos povos daquele lugar a cultivar o trigo. A essa altura, os campos secavam e se tornavam estéreis, pondo em perigo a sobrevivência das criaturas vivas. Zeus, preocupado com tal situação, ordenou a Hades que entregasse sua esposa (agora Perséfone, a rainha do Inferno) à mãe Deméter. Todavia Perséfone havia comido a semente da romã, estando, agora, presa ao marido e ao seu reino. Para solucionar o impasse, Zeus determinou que Perséfone ficasse seis meses com a mãe e seis meses com o marido. Graças a essa solução, a rainha do Inferno saía das profundezas da terra na primavera e subia ao céu quando se abriam no solo as primeiras sementeiras, retornando ao Inferno no outono, quando começavam as colheitas. Seu afastamento de Deméter ocorria no inverno, durante o qual a terra nada produzia.
O mito de Deméter encena o sofrimento materno provocado pelo “ninho vazio”. A trajetória da Deusa em busca da filha perdida ensina às mulheres como se comportar mediante as perdas existenciais, principalmente por ocasião do afastamento das filhas. Essas deusas personificam mulheres que experimentam significativas rupturas psicológicas com elos estruturais básicos e por isso vivenciam estados depressivos e processos reacionários negativos e positivos que favorecem mudança e podem servir de insights para as necessárias transformações femininas».
http://www.revistainvestigacoes.com.br/Volumes/Vol.21.1/as-faces-e-o-significado_Maria-Goretti-Ribeiro_art.11ed.21.pdf
Já em Roma, que adoptou e adaptou os deuses gregos, a situação da mulher não tem um aspecto tão intimista. Embora submetidas ao poder patriarcal (do omnipotente paterfamilias ou seu sucedâneo – o marido ou o sogro de que poderia tornar-se “filha” através do matrimónio – , as mulheres romanas assumem um desempenho que poderemos considerar mais extrovertido, mais visível ou mesmo extravagante, como acontecia com algumas, normalmente privilegiadas. É assim natural que as suas divindades o espelhassem.
Durante o culto dançavam de uma maneira muito livre e lasciva, em de acordo com as forças mais primitivas da natureza.
Os mistérios que envolviam o deus Dioniso provocavam nelas um estado de êxtase absoluto e entregavam-se à desmedida violência, derramamento de sangue, sexo, embriaguez e autoflagelação. Estavam sempre acompanhadas dos sátiros embalados pelos sons dos tamborins dos coribantes, formando uma espécie de trupe que acompanhava o deus do vinho nas suas aventuras. Andavam nuas ou vestidas só com peles, grinaldas de Hera e empunhavam um tirso - um bastão envolto em ramos de videira.
Por onde passavam iam actuando como chamariz na conversão de outras mulheres atraindo-as para a vida lasciva. Evidentemente que o comportamento livre e desregrado delas causava apreensão, senão pânico nos lugarejos e cidades onde o cortejo báquico passava.
Quando assaltadas por um furor qualquer, não conheciam limites ao descarregar a sua cólera. O maior divertimento das Ménades ou Bacantes era submeter os homens ao sofrimento, despedaçando-os antes de comê-los enquanto estavam em transe.
Pela sua crueldade, às Ménades não foi concedida a misericórdia da morte.
Na obra intitulada Bacantes são citadas dezoito Ménades:
Arpe - a flor do vinho
Bruisa - a florescente
Cálice - a taça
Calícore - a formosa dança
Egle - o esplendor
Ereuto - a corada
Enante - a foice
Estesícore - a bailarina
Eupétale - as belas pétalas
Ione - a harpa
Licaste - a espinhosa
Mete - a embriaguez
Oquínoe - a mente veloz
Prótoe - a corredora
Rode - a rosada
Silene - a lunar
Trígie - a vindimadora
E lembramos ainda Vesta, cujo culto data de época anterior aos Romanos, essa divindade do Lar que tem como símbolo o fogo sagrado e purificador, seja da casa ou da cidade, onde as virgens Vestais zelam para que a chama não se apague.
Deixar o fogo apagar-se equivalia a deixar que Roma sofresse a ira dos deuses.
Devido a inviolabilidade do Templo de Vesta e das próprias sacerdotisas, as mesmas também guardavam os objectos sagrados, tratados solenes e testamentos de várias pessoas, entre elas como dos próprios imperadores romanos: Augusto, Tibério, entre outros; como cita Suetónio no seu livro “Vidas dos Doze Césares”.
com guirlandas e rolos pendurados,
viam-se grinaldas robustas trançadas
nos moinhos de pedra.
(Ovídio, Fastos)
Fotografia a partir de: https://www.facebook.com/pages/Pompei-arte-storia-ed-archeologia/283085626261
Lembremos ainda a deusa Iustitia cujo símbolo adoptado se filia na deusa grega Diké, a que se aduzem novos elementos, a exemplo dos olhos vendados, significando equidade perante a Lei.
As mulheres romanas quer as divinas, quer as humanas, participam, portanto, de uma sorte onde se envolvem, desde um primeiro momento, os dois sexos, na igualdade possível…
Eva, essa, participará apenas do devir solitário a que quiseram condenar, no mundo judaico-cristão, até praticamente os nossos dias, a Mulher e para isso basta ler o moralista Tertuliano do Século II d.C.:
«Ó mulher, nas dores e ansiedades dás à luz, vives girando em volta do teu marido, és dominada por ele, e não sabes que, afinal, Eva és tu mesma? Ainda vive em nossos tempos a sentença de Deus a respeito do teu sexo: necessário é que vivas na condição de culpada. És a porta do diabo, aquela que tocou a árvore proibida», in, «A Moda Feminina/Os Espectáculos», p: 38.
in
EURÍPIDES, Medeia,
RIBEIRO, Maria Goretti, Universidade Estadual da Paraíba
Culto di Virtus.
Aspects of Roman History 82 BC-AD 14. A Source-Based Approach Aspects of Classical Civilisation.pdf
Download link: http://www.mediafire.com/file/upemoukawwwkqk4
Heroes and Heroines
File name: Heroes and Heroines of Greece and Rome.pdf
Download link: http://www.mediafire.com/file/h987d8khf5iz8mv
CULTO DI PROSERPINA - PERSHEFONE - KORÉ
http://www.grupoescolar.com/pesquisa/as-deusas-do-olimpio.html
VERGÍLIO, Geórgicas, (Int. Tr. e notas: Gabriel A. F. Silva), Livros Cotovia. 2019
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November 11, 2016
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