Filomena Barata
Liga de Amigos de Miróbriga
Patrimónios de Maio
Á Tita, ao Carlos e à Joana, todos do
mês de Maio
Está quase
Maio a findar. Esse mês que dizem ser das rosas e de tantas flores mais.
Recordo Miróbriga,
Santiago do Cacém, e os visitantes que ali se deslocavam durante este mês de
propósito para ver as colinas da cidade romana, repentinamente cobertas de um
vermelho dançante das papoilas que a invadiam.
Maio é também
o mês dessas flores que eram atributo de Hipno, a personificação do sono, da
sonolência e irmão gémeo da morte a que Romanos fizeram equivaler a Somnus.
Segundo o
escritor Ovídio, poeta latino dos séculos I a.C – I d.C. (43 a.C. - 17 ou 18
d.C.), autor de uma vasta obra, mas de que destaco o poema mitológico Metaformoses,
o deus Mercúrio carregou os sonhos de Morfeu do Vale dos de Somnus aos seres
humanos dormentes. Já muitas centúrias
antes, Hesíodo, no século VIII, também ele poeta, dizia que a divindade era
filho sem pai de Nix (Νύξ, "noite"), a escuridão, Géia, a
deusa das Trevas Primordiais ou da Terra no momento da criação. Teve Somnus
muitos irmãos, entre os quais o mais importante é seu irmão gémeo Thanatos (Θάνατος, "morte"), a
personificação da morte.
Mas a papoila bailante dos nossos campos aparece também associada a
Deméter, a deusa da fertilidade e do trigo, considerado símbolo da Civilização,
enquanto capacidade dos humanos moldarem a Natureza e das Estações do ano. A
papoila era, sem dúvida, a sua flor.
Teve Deméter uma filha do seu irmão Zeus chamada Perséfone que vivia meio
ano nas profundezas da Terra e outra metade vinha ajudar a sua mãe. Com o seu
regresso inaugurava-se a Primavera, marcado pelo Equinócio da Primavera.
Mas regressando a Miróbriga, embora lá não tendo podido ir este ano, foi um
dos locais que recomendei para visita neste mês de Maio, vencidos alguns
temores que a Pandemia nos deixou.
Ao tema dos Museus não me prenderei muito, pese
ter-me dado o destino de nele nascer, mas saliento a sua reabertura ao público,
este ano de 2020, após longo período de confinamento.
Recordo, contudo, que Maias constituem
um ciclo de festivais que, em Roma, se relacionavam com o despertar da
natureza, lembrando antiquíssimos cultos agrários.
Para os gregos, Maia era a mais velha das
Plêiades, uma das sete filhas de Atlas e que, unida a Zeus, foi mãe de Hermes,
o mensageiro dos deuses, conhecido por Mercúrio entre os romanos,
ancestralmente considerado uma divindade agrária e da pastorícia.
Já na mitologia romana, Maia surge-nos
como uma antiga divindade itálica, filha de Fauno e esposa de Vulcano, o deus
romano do fogo (Hefesto na mitologia grega). Era designada de Maia Maiestas
e também de Fauna ou Bona Dea (deusa das Deusas). Maiestas personifica o despertar da
natureza na primavera.
Deusa da primavera, Maia deu nome ao mês
de Maio, que lhe era consagrado. No primeiro dia de maio, o flâmine de Vulcano
sacrificava-lhe uma porca grávida. Era essencialmente venerada por mulheres,
sendo os homens excluídos do perímetro sagrado dos seus templos. Embora não
estando relacionadas originalmente, as duas divindades de origem grega e romana
acabaram por ser identificadas uma com a outra. Muito provavelmente
associando-se remotamente a esses rituais de sagração da primavera, provém o
hábito de pendurar giestas às portas e janelas, nos portões, cancelas, carros
de lavoura e até nos próprios animais, em muitas localidades portuguesas,
afastando o “burro”, igualmente chamado em algumas zonas o “carrapato”, ou
seja, o mau agouro que possa ser nefasto para as colheitas, no início do mês de
maio. E as Maias, meninas vestidas de branco e coroadas de flores, ou as
“marafonas”, as bonecas de pano ou de palha vão sentar-se à porta de casa, na
esquina da rua ou na praceta, pedindo “um tostãozinho para a Maia”. Regiões há
onde se enfeitam ruas e edifícios com coroas de flores de giestas, chamadas
maia ou maio. Ainda hoje as Mais se podem considerar um dos rituais mais
expressivos do ponto de vista da história religiosa antiga, que permaneceu,
segundo alguns estudiosos, sem grandes alterações desde o século V, e que se
exprime, com variantes, em vários pontos do País, celebrando, tal como
acontecia na Roma Antiga, o despertar da natureza e a fertilidade.
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