No Mês
de Augusto
Filomena
Barata
Retrato de Augusto. proveniente de “Myrtilis” (Mértola) .
Fotografia Museu Nacional de Arqueologia
A partir de crónica publicada em Setúbal na Rede, Agosto 2014
Ainda no mês
em que se comemora a morte do Imperador Augusto (23 de
Setembro de 63 a.C. — 19 de agosto de 14 d.C.) cuja importância para o actual
território português foi notória, quer no
que respeita à pacificação do mesmo –a Pax Augusta – quer da grande reforma
administrativa que implementou, tentaremos falar de cidades, um dos
fundamentais alicerces da Romanização.
A cidade
é um dos alicerces de um Império, que assenta, por um lado, na «normalização»
que tenta imprimir às mais longínquas fundações, mas que se sustenta, por outro
lado, à custa da diversidade local e da maximização das potencialidades
regionais, faz-nos dimensionar a complexidade de questões que se levantam ao
estudo da organização urbana em época de dominação romana.
A noção de urbanidade, de que já os Romanos
fizeram um dos pilares «civilizadores», contempla não só o fenómeno citadino
propriamente dito, mas também a ideia de centros polarizadores de unidades
territoriais, administrativas, económicas e produtivas que geram e partilham da
dinâmica da cidade e das permutas feitas entre esta e outros «lugares
centrais».
À volta de um aglomerado central do ponto de vista político e económico, desenvolvem-se no território pertencente à ciuitas um conjunto de actividades económicas de características fundamentalmente rústicas, pois nelas assenta maioritariamente a estrutura do Império que, gradualmente se vai tornando mais comercial.
A relação entre estes «centros» e as suas «capitais» e entre eles e os seus «territórios» fornecedores dos produtos indispensáveis para a manutenção dos aglomerados urbanos não é, por seu lado, estanque ou fixa no tempo, dependendo das relações de dominação militar e política que se estabelecem entre vencidos e vencedores, ou da permeabilidade que se consegue com as pré-existências culturais e económicas.
À volta de um aglomerado central do ponto de vista político e económico, desenvolvem-se no território pertencente à ciuitas um conjunto de actividades económicas de características fundamentalmente rústicas, pois nelas assenta maioritariamente a estrutura do Império que, gradualmente se vai tornando mais comercial.
A relação entre estes «centros» e as suas «capitais» e entre eles e os seus «territórios» fornecedores dos produtos indispensáveis para a manutenção dos aglomerados urbanos não é, por seu lado, estanque ou fixa no tempo, dependendo das relações de dominação militar e política que se estabelecem entre vencidos e vencedores, ou da permeabilidade que se consegue com as pré-existências culturais e económicas.
E será essa
mesma vontade de entender as fundações urbanas de Época Romana o motivo pelo
que, ainda este mês, no próximo dia 23, visitaremos as Ruínas Romanas de Tróia
e Caetobriga (Setúbal) com o
Projecto «Portugal Romano», a exemplo de
outras visitas já realizadas, como Felicitas
Iulia Olisipo (Lisboa), Ammaia,
Marvão; Sines; Miróbriga, Santiago do Cacém, Liberalitas Julia (Évora), Scallabis (Santarém), entre
outras. Embora existam algumas fundações de época augustana, ou pelo
menos assim indicie a topomímia, a exemplo de Bracara Augusta (Braga), é sabido que muitas das cidades romanas em
território actualmente português, embora já existentes, sofreram uma ampla alteração
urbanística nessa época, como se pode confirmar em Conímbriga, quando foi alvo
de importante renovação urbanística sob esse principado e que se estenderá até
finais do século I. Assim viu aparecer as infra-estruturas comuns aos meios
urbanos: casas pobres e ricas, domus
decoradas profusamente com mosaicos, apartamentos, vias, termas, lugares de
espectáculo, como o anfiteatro, e o seu centro cívico ou Forum.
Embora ainda
seja mal conhecida a rede de centros urbanos da província da Lusitânia,
instituída por Augusto, sobretudo,
por falta de investigação, e passarei a citar as palavras de Carlos Fabião, um
especialista da Época Romana, os «textos antigos e epigrafia revelam um leque
variado de núcleos urbanos de que conhecemos somente pequenas parcelas, por
outro, desconhecemos em absoluto onde se localizariam muitos dos identificados
por estas fontes».
No entanto,
inúmeros dos núcleos urbanos referidos por Plínio-o-Velho no século I d.C. foram
sendo gradualmente conhecidos e identificados, alguns dos quais acima referimos,
não esquecendo ainda Pax Iulia, a
capital do conventus, o Conventus
Pacensis) criado também no tempo de Augusto que ocupava o sul do actual território
português, tendo por limite, mais a Norte, o Conventus Scallabitanus.
Mas, sem
dívida, a criação da Lusitânia, provalvelmente em 16 ou 15 a.C. com a capital
em Augusta Emerita (actual Mérida), fundada como colonia em 25 a.C. e a divisão
em novas circunscrições administrativas, os conventus,
vem originar a criação de novas capitais: Augusta Emerita; Pax Iulia e
Scallabis (Santarém), as três com estatuto colonial, que, por sua vez, vem
originar a proliferação de núcleos urbanos de menor escala que estruturaram o
território#.
Poderemos
dizer, assim, que o período imperial que se instala em ambiente de pacificação
com Augusto cria uma nova concepção filosófica e cultural que se reflecte no
urbanismo e na na arquitectura.
A cidade da "utilitas"
(utilidade), "venustas" (beleza) e "firmitas"
(solidez) que o Arquitecto Vitrúvio
defende na sua obra “De
Architectura” , escrita ao que se sabe entre 27 e 16 a.C., assume, com o
novo regime, um carácter mais monumental e mais sumptuário, coroando o poder do
imperador, "instrumento divino da nova ordem". A arquitectura
torna-se, com o Império, a arte por excelência.
Suetónio
(69?-160 d.C.) um biógrafo latino que teria nascido na época do imperador
Adriano e se terá mesmo tornado seu epistolarum
register e, por isso teve acesso aos arquivos do Estado e,
inclusivamente, a conhecer a correspondência de Augusto, dedicou-se a escrever
a vida d’ «Os Doze Césares». Assim se refere na biografia que dedicou a Júlio
César, antecessor de Augusto, que " sobre o embelezamento e enriquecimento
de Roma, assim como sobre a defesa e emgrandecimento do império, (ele) concebia
diariamente os mais variados e vastos projectos; propunha-se, antes de mais, um
templo dedicado a Marte, maior que nenhum dos que existiam em algum lugar do
mundo (...); (e) pôr à disposição do público as bibliotecas gregas e latinas,
tão ricas como fosse possível".
Por sua vez a
obra do imperador Augusto, para além da implementação da ampla reforma
administrativa já mencionada e da criação de novos núcleos urbanos, foi, em
grande parte, consagrada a reparar as ruínas deixadas em Roma pelas guerras
fraticídas dos últimos tempos da República.
Os restauros
em antigos templos e a construção de novos, com a finalidade de reacender o
espírito religioso canalizando-o para o culto imperial, são sintomas da clara
consciência que os romanos têm da vantajosa associação de construções
monumentais às manifestações de índole religiosa e política. Só no ano 28 d.C.
se restauraram 80 templos em Roma e terminaram-se muitas obras que tinham
ficado incompletas.
Suetónio
diz-nos ainda na Vida dos Doze Césares que Augusto "Embelezou a cidade de
Roma, (que) não (era) ornamentada segundo a magestade do Império e exposta a
inundações e incêndios, de tal forma que com razão se vangloriou de "
deixar de mármore a que tinha herdado de ladrilho". O Forum de Augusto
"uma das obras mais belas jamais vista", segundo Plínio (23 d.C. – 79
d.C.) na sua História Natural o primeiro exemplo de um grande conjunto
arquitectónico totalmente construído em mármore. Augusto também deixou Roma
segura para a posteridade, "quanto pode prever-se com a razão
humana", tendo criando um corpo de guardas nocturnos que vigiavam os
incêndios e mandando limpar o leito do Tibre, responsável por muitas
inundações.
Também refere
ainda Suetónio que Augusto construiu muitíssimos monumentos públicos, referindo
como principais um foro com um templo de Marte Vingador, um templo de Apolo no
Palatino, outro de Júpiter no Capitólio. "Além disso, exortou os notáveis
a embelezar a cidade, segundo as possibilidades de cada um, com monumentos
novos ou reconstruindo e enriquecendo (os existentes)". Ao reconstruir os
templos em ruínas ou destruídos, "enriqueceu-os a uns e a outros com
presentes esplêndidos".
Por outro
lado, a reorganização municipal de Roma permite uma reforma de índole religiosa.
Aos Lares de cada vicus Augusto associa o Génio do príncipe que, deste modo,
consuma a religião imperial. Muitas das iniciativas religiosas passaram a ser
subordinadas às do princeps que se tornou, a partir de Augusto, sumo pontífice.
(31)
Um outro autor,
Virgílio (70 a.C – 20
a.C.) a que nos dedicaremos numa outra entrada, "celebrando a terra italiana e
a pátria romana, tornar-se-á o auxiliar da obra restauradora de Augusto",
ao reanimar a velha epopeia romana e ao exaltar as qualidades inerendes à
latinidade, designadamente no que se refere às suas raízes agrícolas.
Sem querer,
nem de longe, nem de perto, prestar-lhe as honras como fazia o colégio
sacerdotal que ele próprio criou para lhe render culto, o Colégio dos
Augustais, gostaria apenas deixar como apontamento que Augusto foi exímio
propagandista de si próprio, tendo criado um conjunto de símbolos religiosos que
têm reflexo e invadem a própria na vida cotidiana, mas a que também nos
dedicaremos em posterior trabalho, deixo apenas uma nota, pois falamos de
Setúbal e do Sado, e os golfinhos foram também símbolos do próprio imperador.
Lembremos que este mês de Augusto era marcado por inúmeros festivais, rementendo para o artigo publicado em IMPERIVM ROMANVM , disponível em:
http://www.romanoimpero.com/2016/08/agosto.html
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