sexta-feira, 10 de julho de 2015

O Solstício de Inverno, Filomena Barata

 07-12-2012 

Património
por Maria Filomena Barata
(Liga de Amigos de Miróbriga)
 

Vamos falar do Solstício de Inverno?



"Enquanto isso, o chefe da família escrava, cuja responsabilidade era oferecer sacrifício aos Penates , para gerenciar as disposições e dirigir as atividades dos empregados domésticos, chegou a dizer a seu mestre que a família tinha festejado segundo o costume ritual anual. Pois, este festival, em casas que mantêm a utilização religiosa adequada, que antes de tudo honrar os escravos com um jantar preparado como se fosse para o mestre e só depois é a mesa posta novamente para o chefe de família. Assim, então, o escravo chefe veio para anunciar a hora do jantar e convocar os mestres para a mesa".



Lucerna com representaçãso de Hélio ou Mitra. Centro Histórico de Sines. Museu de Sines.

O Solstício (do latim sol + sistere, que não se mexe) de Inverno tentarei falar um pouco da importância da Luz para a nossa vida e desse momento em que o Sol, durante seu movimento aparente na esfera celeste, atinge atinge a maior declinação em latitude, medida a partir da linha do Equador.
Os solstícios ocorrem duas vezes por ano: no inverno, este que iremos comemorar agora, e no verão, em junho.
Variam o dia e a hora exactos. Contudo, no inverno, corresponde à noite mais longa do ano, ocorrendo por volta do dia 21 de dezembro, e, no verão, corresponde à duração maior do dia, por volta de 21 de junho.
Os Homens, desde remotas alturas, até pela sua relação íntima com a Natureza e com as estrelas, designadamente o Sol que rege a Vida e o Tempo, tiveram vários cultos dedicados ao Astro Rei.
O Sol, sendo a maior luz do céu visível aos Humanos, é para muitos povos um dos símbolos mais importantes, sendo até venerado como um Deus ou encarado como manifestação da divindade entre muitos. Ao contrário da Lua, o Sol que tem luz própria, é afinal a própria essência da Luz, e é quase sempre interpretado como símbolo masculino e por isso associado ao princípio Yang. Ou seja, representa em muitos culturas, se bem que nem em todas, o princípio activo, enquanto a Lua é um princípio passivo. Ao Sol associa-se a noção de calor e de Vida, pois sem ele nada sobrevive.
Já na época de César, Roma se havia rendido ao culto do
Sol Invictus, mas é depois do grande incêndio de 64 d.C., quando uma grande parte de Roma foi destruída, que Nero manda edificar uma estátua colossal do mesmo, com120pés de altura (Suetónio,
Vida de Nero, XXXI.).
Vespasiano foi o primeiro imperador a colocar a imagem do Sol numa cunhagem oficial.
É em finais dessa centúria,em274, ao reinado de Aureliano, que atribuía a "Sol Invictus" as suas vitórias no Oriente, que esta religião se torna oficial, tendo o imperador mandado edificar em Roma um templo dedicado ao deus e foram incumbidos sacerdotes de lhe prestar culto. O máximo dirigente deste era o "pontifex solis invicti".

Também em Roma, associado ao Solstício de Inverno, temos as Saturnália, um festival em honra de Saturno, uma divindade de origem grega cujo culto foi importado para Roma, que ocorria no mês de Dezembro, também em correlação com o solstício de inverno (era celebrada no dia 17 de dezembro, mas ao longo dos tempos foi sendo estendida a uma semana completa, terminando a 23 de dezembro).

As Saturnálias tinham início com grandes banquetes e sacrifícios que eram acompanhados por doações simbólicas. Durante estas festividades, havia como que uma subversão da ordem social, um pouco como as brincadeiras que actualmente se fazem por altura do Carnaval: os escravos podiam comportar-se neste período como homens livres; elegia-se, à sorte, um "princeps" - uma espécie de caricatura da classe nobre - a quem se entregava todo o poder e eram usadas máscaras.
Contam algumas lendas que Saturno tinha sido expulso por Zeus do Monte Olimpo e se havia instalado no Capitólio, onde fundou um povo chamado Saturnia. Acredita-se também que foi acolhido por Jano, uma divindade igualmente oriunda da Grécia.
Mas também o deus Mitra cujo nascimento era celebrado, tal como o Menino Jesus, a 25 de dezembro, tinha uma forte relação com o Sol.
Este deus de origem oriental vai ter grande adesão junto dos soldados romanos, ou seja os legionários, quer pelos cidadãos.
Mitra, ou Mithras, cujo nome significa em Sânscrito "Amigo"; em Persa quer dizer "Contrato". Trata-Se de um Deus luminoso que incita os homens a seguirem o Seu caminho no combate pela Luz contra as Trevas. Mitra tem naturalmente um forte carácter solar, porque a sua Luz é a síntese da Luz do Sol e da Lua, e o Seu o Domingo é o dia dedicado ao seu culto.(no Latim pagão, domingo é «Dies Solis», ou «Dia do Sol»).
Ao que se sabe, o culto mitraico parece ter chegado ao Ocidente no decorrer do século II d.C., através das legiões romanas, tendo grande impacto em Roma e data dessa centúria a construção de inúmeros santuários, ou Mithraea. A primeira referência escrita ao culto mitraico é de Plutarco, datável do século I a.C., referido que os piratas cilícios praticaram os mistérios mitraicos até 67 a.C. Daqui, esta religião e culto chegou aos países do Danúbio e a Itália. Os principais adeptos de Mitra eram soldados, como acima dizíamos, funcionários administrativos e comerciantes.
No Ocidente, o seu culto acabou por confundir-se com o do Sol Invictus, ou Sol Invencível, pois verifica-se, em finais do século III, o sincretismo entre a religião de Mitra e outros cultos solares de procedência oriental. É em finais dessa centúria, em 274, ao reinado de Aureliano, que atribuiu a Sol Invictus as suas vitórias no Oriente, que esta religião se torna oficial, tendo o imperador mandado edificar em Roma um templo dedicado ao deus e foram incumbidos sacerdotes de lhes prestar culto. O máximo dirigente deste era o pontifex solis invicti. O mitraísmo manteve-se como culto não oficial, havendo quem professasse, ao mesmo tempo, o mitraísmo e a religião do Sol Invictus.


Sol Invictus (Século III d. C.) Pessinus (British Museum)
Fotografia a partir de: 
https://en.wikipedia.org/wiki/Sol_Invictus

Com a chegada dos invasores romanos à Península Ibérica, e particularmente dos exércitos, originou-se um novo surto desses cultos orientalizantes, apesar da sua penetração no Ocidente ser de período muito anterior ao romano. Quer na cidade romana de Tróia, Grândola, onde muitos autores querem ver a sua representação num beixo-relevo, quer em Beja está comprovado o Culto Mitraico, que se expandiu na Hispânia a partir de finais do século II – inícios do século III d. C., a par de outros cultos orientais, tais como de Serápis, Ísis, Cibele-Magna Mater. O Sol ou Ormuzd, para os Persas, enquanto fonte de Luz, representava a Vida, a Saúde e a Fertilidade da terra enquanto criadora de todas as coisas necessárias à sobrevivência do Homem; à Lua ou Arimânio, atribuíam-lhe forças maléficas; as trevas e a esterilidade da Terra. Mitra surge assim como um terceiro elemento, como uma espécie de divindade mediadora entre duas forças antagónicas, viabilizando o nascer de um novo dia, ou seja, não permitindo que a Lua ocultasse o Sol.
Assim, mais do que o Sol, Mitra representa a Luz Celestial, ou a essência da Luz, que desponta antes do Astro-Rei raiar e que ainda ilumina depois dele se pôr e, porque dissipa as trevas, é também o deus da Integridade, da Verdade e da Fertilidade, motivo pelo que também surge associado à força genésica do Touro, o Touro primordial que Mitra é incumbido de matar.
Que seja o Solstício que se aproxima um recomeçar de um ciclo solar no caminho de mais Luz.
E que a árvore da Vida, também ela já cultuada pelos povos da Antiguidade, nos traga um ano melhor, aproveito para citar uma frase do poeta latino do século I «os netos colherão os frutos das tuas árvores», nestes tempos em que a crise nos atormenta, como palavras de esperança do Futuro.

Sobre o culto mitraico:

https://www.academia.edu/1071483/O_Culto_Mitraico_e_a_sua_Representa%C3%A7%C3%A3o_em_Portugal

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